A 22ª edição da ICASA ocorreu em Harare, capital do Zimbábue, de 4 a 9 de dezembro de 2023. Militando pelo advento de uma África sem o VIH, esta conferência, que se reúne a cada dois anos, teve como tema: “A SIDA ainda está aqui: Eliminemos as desigualdades, aceleremos a inclusão e a inovação”. Foi o que revelou o Padre Ismaël Matambura, jesuíta congolês e diretor da Rede Jesuíta Africana contra a SIDA (AJAN – Africain Jesuit AIDS Network), em uma entrevista à Rádio Vaticano.
Christian Losambe, SJ – Cidade do Vaticano
“A Conferência Internacional sobre a Sida e Infeções Sexualmente Transmissíveis em África (ICASA) é uma importante conferência internacional bilíngue que ocorre na África”. Sua realização bienal é alternada entre os países africanos de língua francesa e inglesa. Organizada pela Sociedade Africana Anti-SIDA, em colaboração com o UNAIDS, a ICASA ocorre há 30 anos para mitigar a propagação e atenuar o impacto do VIH/SIDA, tuberculose, malária e seus efeitos prejudiciais nas estruturas africanas, visando um continente onde o estigma contra as pessoas vivendo com o VIH (PVVIH) e suas famílias não terá lugar. Essa estrutura também visa a justiça social e a equidade no que diz respeito ao acesso a tratamentos, cuidados e apoio. Nessa perspetiva, o tema escolhido este ano pela ICASA foi: “A SIDA ainda está aqui: Eliminemos as desigualdades, aceleremos a inclusão e a inovação”.
Numa entrevista à Rádio Vaticano, o padre jesuíta congolês Ismaël Matambura, participante da 22ª edição da ICASA em Harare, contextualizou o evento, apresentou os objetivos e as resoluções alcançadas durante a conferência. Além disso, como diretor da Rede Jesuíta Africana contra a SIDA, ele apresentou algumas estratégias implementadas pela AJAN na luta contra as doenças sexualmente transmissíveis.
Uma luta prejudicada pelos impactos da COVID-19
A ICASA, destacou o diretor da AJAN, “representa uma excelente oportunidade para pesquisadores e clínicos de todo o mundo compartilharem as últimas descobertas científicas, aprenderem com as experiências e a perícia de cada um, e desenvolverem estratégias para concretizar todas as facetas dos esforços coletivos globais para pôr fim à SIDA em África e no mundo até 2030”. Ele ressaltou que a realização desta conferência ocorre um ano após o relatório global sobre a SIDA, publicado pelo UNAIDS em 2022, que revelou os potencialmente catastróficos efeitos da COVID-19 nos sistemas de saúde relacionados ao VIH em todo o mundo, caso não sejam fortalecidos.
Diante de progressos hesitantes, diminuição de recursos, crescentes desigualdades e falta de inovação, o Padre Matambura esclareceu que é com base nesse contexto que a ICASA, este ano, definiu objetivos “não apenas para abranger a luta contra o VIH, mas também outras doenças relacionadas, como tuberculose, hepatites, malária e outras doenças infecciosas”. Mais concretamente, ele continuou, “a ICASA visa integrar o respeito, a equidade, a inclusão e a diversidade no controlo e mitigação do impacto dessas doenças; e consolidar e aumentar os recursos financeiros para atender às enormes necessidades das comunidades”.
O VIH ainda está presente
“O VIH ainda está presente“, declarou o jesuíta congolês. “Quando você olha para os dados epidemiológicos fornecidos pela UNAIDS neste ano de 2023, vemos que ainda há pessoas infectadas pelo VIH. Atualmente, em toda a África subsaariana, mais de 20 milhões de pessoas vivem com o VIH. Infelizmente, as pessoas mais afetadas nessas novas infecções são os jovens com menos de 24 anos”, explicou. No entanto, ele destacou que “é necessário eliminar as desigualdades, acelerar a inclusão de todos e construir sobre a inovação para acabar com o VIH até 2030”.
Resoluções tomadas em vários níveis
Após a 22ª edição da ICASA, várias resoluções em termos de recomendações foram tomadas. O diretor da AJAN mencionou algumas delas, distribuindo-as em três perspetivas. Primeiramente, do ponto de vista biológico e patológico, ele afirmou que “os participantes desta conferência expressaram a necessidade de desenvolver vacinas contra hepatites, ISTs e até contra o VIH”. Em seguida, sob um aspecto clínico e científico, dada a diferença observada na prestação de cuidados a adultos e crianças, foi feito um apelo para um maior envolvimento nessa área, visando proteger e melhorar a qualidade do tratamento em crianças.
“Também é necessário focar mais em pessoas de alto risco, incluindo jovens, idosos e homossexuais, e integrar outras doenças como câncer de útero em mulheres e doenças mentais e cardiovasculares”, acrescentou o Padre Matambura. Além disso, ele enfatizou que “pensar em ter seguros de saúde universais poderia favorecer muito o acesso de todos a cuidados adequados”. Por fim, do ponto de vista social, os participantes foram instados a se envolver na luta contra a estigmatização de pessoas vivendo com o VIH nos países africanos.
Algumas dificuldades enfrentadas pela AJAN
Como diretor da Rede Jesuíta Africana contra o SIDA, que trabalha em colaboração com a Sociedade Africana Anti-SIDA, o Padre Matambura mencionou algumas dificuldades enfrentadas por essa estrutura da Companhia de Jesus no âmbito da prevenção e sensibilização contra ISTs. Desde logo, o padre jesuíta destacou o problema de relaxamento observado especialmente entre os jovens, em termos de formação e mesmo de comportamento adotado em relação ao VIH. “Não temos mais o que tínhamos há uma década: fóruns e sessões de sensibilização em grande escala sobre essa doença. Isso cria problemas e faz com que os jovens fiquem mais expostos”, lamentou.
Além disso, “a miséria nos países africanos torna a luta muito difícil, promovendo anti-valores“, continuou o Padre Matambura. “Há pessoas envolvidas na prostituição e envolvidas em relações sexuais transacionais, em troca de algum outro serviço, o que agrava os casos de violência juvenil”, explicou. Ele também destacou que o isolamento em ambientes africanos impede as intervenções da AJAN devido à dificuldade de acesso. Como resultado, muitas pessoas permanecem em perigo pela falta de serviços de saúde necessários.
O Padre Matambura afirmou que a falta de recursos financeiros diante de necessidades crescentes ainda é uma das grandes dificuldades, sem esquecer a pastoral dos jovens, que, segundo ele, “não está sempre bem organizada em nossos ministérios, tanto na Companhia de Jesus como em outros lugares”.
AJAN se compromete a “confiar a liderança às comunidades“
O tema escolhido este ano para o Dia Mundial de Luta contra o VIH foi intitulado “Comunidades liderando“. O diretor da AJAN expressou sua alegria ao ver que essa visão da UNAIDS e da OMS coincide com a do Rede Jesuíta Africana contra o SIDA. Nesse sentido, o objetivo perseguido por essa estrutura jesuíta é dar poder às comunidades, pois, de acordo com o padre, elas conhecem melhor seus problemas.
Com base na força representada pelos jovens, o Padre Matambura destacou que ações são iniciadas e executadas por eles, com a ajuda dos diferentes centros relacionados à AJAN. “E, como entendemos que, com os jovens, eles têm muitos talentos, têm muitas potencialidades que podemos usar para encontrar soluções para um problema específico, continuamos a trabalhar nessa área para dar a eles as ferramentas necessárias para combater a pobreza em suas comunidades”, explicou. “Queremos também integrar ainda mais a tecnologia existente em nossa estratégia de compartilhamento de formação com os jovens e outras pessoas com as quais trabalhamos”, acrescentou.
Um apelo para promover valores
Ao final da entrevista, o diretor da AJAN reconheceu que progressos significativos foram feitos na luta contra o VIH. No entanto, vários esforços ainda precisam ser feitos. Ele convidou especialmente os jovens africanos a promoverem valores que possam ajudar nesse sentido. “Na África, temos valores, em nossas tradições, e até mesmo valores religiosos que são muito importantes na formação do caráter e na mudança de comportamento. Promover os valores seria um elemento crucial na luta contra o VIH“, exortou.
A luta contra o VIH é uma questão que envolve de todos
Além disso, o Padre Matambura fez um apelo aos governos dos países africanos, às Nações Unidas e a todos os parceiros da Rede Jesuíta Africana contra o SIDA, “para levar a sério as confissões religiosas, pois têm acesso a todas as categorias da população, mesmo onde o Estado não está presente”. “Também somos chamados a combater a estigmatização das confissões religiosas, integrando-as, nesta luta, para que, juntos, possamos encontrar soluções duradouras”, concluiu, destacando que todos estamos envolvidos, “mesmo que não estejamos infectados, todos continuamos afetados por estarmos inseridos em comunidades devastadas pelo VIH”.
Source: https://www.vaticannews.va/fr/monde/news/2023-12/l-icasa-ensemble-pour-une-afrique-sans-vih.html
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